No Dia Nacional de Luta das Pessoas com Deficiência, comemorado no dia 21 de setembro, o Conselho Federal de Medicina (CFM) discutiu o tema da inclusão e acesso dessas pessoas ao emprego. O assunto foi abordado em mesa redonda na tarde dessa sexta-feira (21), durante o VI Fórum de Medicina do Trabalho.
Conforme explicou Josierton Cruz Bezerra, do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), a avaliação médica biopsicossocial da pessoa com deficiência ” respaldada por diversas regulamentações e pela própria Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência ” é um aspecto de suma importância ao abordar o tema.
Essa avaliação biopsicossocial está alinhada ao conceito contemporâneo segundo o qual pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.
“Ou seja, a avaliação médica deve considerar as limitações de ordem biológica do indivíduo e também essas barreiras que podem obstruir a plena e efetiva inclusão na sociedade”, explica Bezerra.
Para ele, a inclusão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho ainda é um desafio, pois a maior parte dos inseridos são aqueles com deficiência motora e muitas empresas contratam apenas para cumprir a legislação, preferindo aquelas com deficiências de grau leve. “Os médicos devem participar desse debate e promover a divulgação de conceitos e o alinhamento das políticas relacionadas à deficiência. A Medicina do Trabalho tem papel muito importante nessa questão”, ressalta.
Para complementar o debate, Paulo Rebelo, vice-presidente da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT), abordou a adaptação razoável, conceito presente na Convenção de Direitos das Pessoas com Deficiência, da ONU, que significa as modificações e os ajustes necessários para assegurar que as pessoas com deficiência possam exercer todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. “Estamos falando da integração ao ambiente no qual ela se encontra”, explica.
Para Rebelo, é preciso o bom senso entre o desejo e o possível para não acarretar “ônus desproporcional ou indevido” ” como alertado na própria Convenção ” ao promover essa integração. “O indivíduo tem que se situar no ambiente de trabalho, estar inserido em uma comunidade, na família e na escola. Para isso precisa recursos financeiros, oportunidades e tecnologias”, diz.
Legislação “ Outro tema de bastante proeminência foram os debates sobre legislação. A esse respeito, falaram, abordando diferentes vieses, o juiz titular da 4ª Vara do Trabalho em Goiânia, Fabiano Coelho; o analista técnico de Políticas Sociais na Secretaria de Previdência (SPrev) do Ministério da Fazenda, Orion Sávio Santos Oliveira; o juiz do Trabalho da 5ª Vara de São José dos Pinhais, Leonardo Vieira Wandelli; e a conselheira do CRM-PR, Keti Stylianos Patsis.
Uma das principais críticas dos expositores atingiu a Reforma Trabalhista. “Houve um discurso oficial de modernização da legislação, liberdade de contratação e segurança jurídica, mas temos intenções não reveladas que seriam reduzir de alguma forma a proteção do trabalhador e inibir a interpretação da lei pelo Poder Judiciário”, disse Fabiano Coelho.
Para ele, “é preciso um esforço hermenêutico para conferir uma interpretação razoável dessa nova legislação, que esteja em conformidade com a Constituição Federal, com os direitos fundamentais e as convenções da OIT e demais tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo País”.
O grupo também comentou os desafios da violência no trabalho, sobretudo do assédio moral, e as interfaces da Legislação Previdenciária com a Medicina do Trabalho. Sobre o assédio moral, o juiz Leonardo Vieira Wandelli lembrou que ele pode ser praticado por agentes personalizados ou mesmo ter um caráter organizacional, que significa a “internalização de um ideário de uso sistêmico de práticas de violência em face dos trabalhadores com finalidade gerencial, resultando em aumento de danos à saúde”.
Para ele, hoje vivenciamos “um grau endêmico de sofrimento no trabalho, que não solucionado desemboca em fator patogênico”. Por isso, a violência e o assédio no trabalho devem ser combatidos com a consciência de que “o foco de luz deve se deslocar do corpo do trabalhador como objeto de responsabilização e culpabilização para as condições de trabalho que favorecem ou desfavorecem a sua saúde”, disse, ressaltando o papel do médico do Trabalho nessa tarefa.
Já o tópico Legislação Previdenciária teve como objeto de discussão o chamado Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP). Para a conselheira Keti Stylianos Patsis, essa referência precisa ser aprimorada. Em sua apresentação, ela lembrou que a perícia médica do INSS poderá deixar de aplicar o NTEP quando dispuser de informações ou elementos circunstanciados e contemporâneos à exposição ou à situação administrativa do segurado que evidenciem a inexistência do nexo causal entre o trabalho e o agravo. “O NTEP tem equívocos em sua concepção e confunde a existência de correlação entre duas variáveis de causa e efeito. Existem “nexos” sem sentido. Temos que aprimorar e corrigir”, defendeu a especialista.
O VI Fórum de Medicina do Trabalho do CFM também contou com a apresentação de Orion Sávio Santos Oliveira, que falou sobre o Sistema de Escrituração Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial).
Ele classifica o sistema como uma nova forma de registrar todos os eventos que acontecem na vida do trabalhador. “Tudo será registrado em um único canal que será acessado por um consórcio de órgãos públicos como Ministério do Trabalho, Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Caixa Econômica Federal, Ministério da Fazenda (Receita Federal e Previdência Social)”, disse.
O foco de sua apresentação foram os cinco grupos de informação de Segurança e Saúde: descrição dos ambientes de trabalho; informações sobre o monitoramento da saúde do trabalhador; condições ambientais do trabalho; comunicação de acidentes de trabalho; e treinamentos e capacitações. “O eSocial não altera a legislação ou cria novas obrigações e existências. O que vamos ter é uma revolução na forma como as informações são registradas e disponibilizadas ao poder público, gerando melhoria da qualidade das informações. O que mais importa é que se reflita na saúde do trabalhador”, diz o analista.