Artigo: Seremos substituídos por máquinas?

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Artigo: Seremos substituídos por máquinas?

Você sabe o que é um chatbot” Um chatbot é um robô-software que por meio de um chat interage com seu usuário (chat + bot, de robot). Providos de inteligência artificial, os chatbots conversam com as pessoas por meio de voz ou texto tanto sobre informações úteis como o clima ou a cotação do dólar quanto sobre como foi o seu dia, por exemplo. O Google Assistent nos smartphones Android e a famosa Siri no iPhone são os exemplos mais conhecidos.
 
O que você provavelmente não sabia é que já existem chatbots médicos. Conhecidos como Personal Health Assistants, PHAs ou assistentes de saúde pessoal, estas ferramentas de telemedicina se utilizam da inteligência artificial para coletar informações e dar diagnósticos. Os bots realizam perguntas ao doente por meio de um aplicativo, simulando uma entrevista médica com base em algoritmos referentes aos sinais e sintomas apresentados a eles. No final, o software avalia as respostas e entrega ao usuário as principais doenças que podem estar relacionadas ao seu quadro clínico em ordem de prioridade do mais ao menos provável, orientando sobre prevenção e tratamentos específicos e alertando se a pessoa deve se deslocar a um hospital imediatamente ou consultar com um médico com brevidade. O objetivo é reduzir a ansiedade relacionada à sensação de doença, desenvolver o auto-cuidado e direcionar às emergências médicas os pacientes mais graves, evitando deslocamentos desnecessários. 
O aplicativo mais conhecido no mercado se chama Ada Health. Desenvolvido por uma empresa anglo-alemã chamada Ada Digital Health, é oferecido gratuitamente nas plataformas iOS e Andrioid desde abril de 2016. Recentemente esta empresa recebeu um investimento de 40 milhões de euros para ampliar o seu desenvolvimento. Testei o aplicativo algumas vezes e a acurácia é impressionante. Em se tratando de diagnósticos que necessitam do preenchimento de critérios na anamnese para sua definição, a máquina vence o homem. 
É incontestável que estamos vivendo uma revolução na saúde desde o surgimento do Dr. Google, fenômeno causado pelo livre acesso das informações em saúde pelos pacientes na internet. O telefone convencional e as consultas presenciais estão entrando em desuso, dando lugar às conferências à distância e ao uso dos smartphones como dispositivos utilizados para troca de informações entre médicos e pacientes. Vivemos a era dos aplicativos, dos livros digitais e dos portais referência de informação médica como o Dynamed, o UpToDate e o Medscape. 
No que se diz respeito ao exercício da medicina, a inclusão digital da população está tornando a comunicação médico-paciente por meio de aplicativos, por exemplo, uma relação moralmente aceitável e o conselho federal de medicina (CFM) lentamente vem aceitando esta nova realidade. Entretanto, ainda não definimos como categoria profissional de que forma estes novos métodos de comunicação médica gerarão honorários e garantirão confiabilidade e segurança para profissionais e pacientes. 
Quando se questiona se a inteligência artificial poderá substituir uma avaliação médica, a discussão é delicada pois envolve compreender de que forma o mundo está se comunicando nos dias de hoje em relação à medicina atual. Infelizmente nossa prática está cada vez mais automatizada, baseada na obrigatoriedade de uma consulta presencial com pouca comunicação centrada na pessoa (mais focada no reconhecimento de padrões e checagem de informações de acordo com manuais diagnósticos ou guidelines), solicitação exagerada de exames complementares, e intervenções muitas vezes desnecessárias. Quero deixar claro que isto não é medicina. Não tenho dúvidas de que quanto mais mecânicos e matemáticos formos, mais rapidamente seremos substituídos por programas de computador. O cerne da prática médica é a observação humana e a interpretação da moléstia da pessoa em relação à sua percepção e ao ambiente onde ela está inserida. Este diagnóstico nenhuma máquina conseguirá fazer.
Hoje o acesso a informação médica de boa qualidade não é um privilégio exclusivo dos profissionais. Leigos podem aprender sobre doenças à distância no mesmo nível técnico que uma universidade oferece. Com a evolução da inteligência artificial, muitos processos tradicionais de trabalho médicos, como a obrigatoriedade de uma avaliação presencial para coletas de dados diagnósticos, renovação de prescrição, orientações para problemas prevalentes e a interpretação humana de alguns exames de imagem, por exemplo, entrarão em extinção. 
Entretanto, por mais que a tecnologia torne as pessoas cada vez mais independentes, é clara a percepção de que as mesmas estão fisicamente mais distantes umas das outras. Com mais textos e imagens e com menos gestos e olhares, o mundo está modificando drasticamente sua forma de se relacionar e não temos como mensurar quais serão os efeitos desta “despersonalização” da comunicação. Analisando o contexto atual, mesmo com um universo de informações à palma da mão, muitas pessoas continuam buscando no contato interpessoal uma forma de cuidado de saúde diferenciada. Entender este processo será fundamental para discutir os caminhos da saúde e da medicina no futuro. 
Talvez a chegada da inteligência artificial nos permita voltar a ser médicos. A humanização do contato médico-paciente por meio do aprimoramento das habilidades em comunicação, da empatia e do método centrado na pessoa é o caminho que salvará medicina da ameaça da automatização.
Marcos Vinícius Ambrosini Mendonça
Médico de Família e Comunidade
Diretor do exercício profissional da AMRIGS

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