Pejotização do segmento médico

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Pejotização do segmento médico

Existem basicamente 02 (dois) nichos de abordagem: um relacionado a atividades trabalhistas e outro a questões fiscais e tributárias. A primeira trata da contratação de médicos via PJ (Pessoa Jurídica). Já a segunda aborda atos pretensamente evasivos praticados por empresas do setor privado.

Aspectos trabalhistas

As divergências trabalhistas remontam a período anterior ao advento da Lei nº 13.429/2017, conhecida como lei da terceirização.

Um caso emblemático envolveu em 2015 o Ministério Público do Trabalho (MPT) e o Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. À época, o MPT postulou a condenação do hospital por dano moral coletivo, sob a alegação de que alguns médicos estariam prestando serviços via PJ.
 
O Judiciário, contudo, entendeu que não obstante a prestação de serviços médicos dentro do hospital se dar por meio de pessoa jurídica, tal atividade não configuraria infração às leis trabalhistas, já que se trata de situação inerente à classe, que não mantém com o tomador, vínculo de exclusividade.

Desde 2018 vigora a nova lei que, dentre outros pontos, alterou as regras de terceirização nas empresas, e reconheceu a possibilidade de terceirização das atividades fim. As novas regras chegaram a ser contestadas perante o Supremo Tribunal Federal que decidiu pela constitucionalidade da medida.

Em recente julgado, a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, ao analisar uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho relativa à terceirização da contratação de 1.400 médicos especializados para atuar em todas as unidades de um laboratório do RJ, decidiu por afastar a obrigatoriedade de contratar médicos na condição de empregados, tomando como base de fundamentação a citada lei da terceirização (Lei 13.429/17) e a lei que instituiu a reforma trabalhista (Lei 13.467/17), mantendo o reconhecimento do vínculo apenas dos médicos que efetivamente trabalhavam de forma subordinada antes da vigência das mencionadas leis.

Em primeira instância, o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) entendeu que se tratava de “pejotização”, ou seja, o trabalhador constitui pessoa jurídica para prestar serviços à empresa, mas, na prática, tem perfil de empregado, visto que encontram-se presentes os principais pressupostos que caracterizam o vínculo, quais sejam: pessoalidade, não eventualidade, subordinação e onerosidade.

No Recurso de Revista interposto ao TST pelo laboratório, o Relator, Ministro Alexandre Agra Belmonte, destacou no relatório que a ação envolve efeitos futuros, porém, levando-se em consideração a vigência das leis da terceirização (13.429/17) e da reforma trabalhista (13.467/17), a empresa pode terceirizar livremente serviços, até mesmo na atividade-fim.

A Turma, seguindo o voto do Relator, determinou que o laboratório registrasse a carteira de trabalho apenas nos casos em que ficou comprovada a subordinação, com obrigação de comparecimento habitual, horário de trabalho e impossibilidade de substituição por outro profissional, excluindo da condenação, a partir da vigência das duas leis (terceirização e reforma trabalhista), a proibição de contratar médicos autônomos ou por meio de pessoas jurídicas regularmente constituídas, mesmo que nas instalações dos laboratórios tomadores de serviços.

Aspectos fiscais e tributários

Atualmente esta é a maior preocupação expressa pelo segmento médico e, também, o ponto tratado como preocupante pelos artigos que colocam em pauta a questão da “pejotização”.

O cerne da questão estaria, principalmente, na menor carga tributária que incide sobre as PJs quando comparada à Pessoa Física, além da diminuição dos impostos incidentes sobre a folha de pagamento do profissional contratado via CLT ou que receba via RPA. Na leitura simplista, significa menor pagamento de impostos utilizando-se de estratégias tributárias. Mas, tratando-se de prática prevista na legislação, pode-se considerar uma manobra tributária evasiva?

Todo o profissional da área médica pode empreender, de forma que é lícito e legal poder gerir como melhor lhe aprouver a forma como se relaciona profissionalmente com hospitais, clínicas e consultórios do setor da saúde

Contudo, para que o seu empreendimento esteja regular, faz-se algumas recomendações:

– Manter uma estrutura organizacional – o que inclui uma separação efetiva do patrimônio da Pessoa Jurídica do patrimônio dos sócios.

– Estabelecer cláusulas no Contrato Social da Pessoa Jurídica acerca da retirada de Pró-Labore e da participação de cada sócio nos lucros e nas perdas, para assegurar, inclusive, as distribuições de resultados proporcionais aos percentuais das quotas individuais dos sócios.

– Contribuição ao INSS sobre a retirada de Pró-Labore do Sócio Administrador da Pessoa Jurídica – na condição de Contribuinte Individual, será obrigatória a contribuição ao INSS sobre a retirada de Pró-Labore, tanto a parte patronal, quanto a do contribuinte (caso este ainda não recolha sobre o teto em outras fontes de rendimentos).

– Manter as obrigações fiscais e tributárias em dia – o que significa o pagamento dos impostos dentro do prazo.

– Manter as obrigações acessórias em dia – este tópico em especial requer uma grande cooperação do Sócio Administrador da Pessoa Jurídica e do Profissional da Contabilidade responsável, pois o primeiro será responsável por fornecer as informações em dia (como os extratos bancários, comprovantes de contratação de serviços, compra de materiais e compra de equipamentos) para que o segundo mantenha as escriturações e as demonstrações da Pessoa Jurídica atualizadas.

– Manter Alvará e Licenças de Localização e Funcionamento – mesmo que a atividade não seja prestada no local, é importante para assegurar o aval do ente municipal sobre a recorrente fiscalização ao estabelecimento.

Posicionamento do CFM e demais associações de classe

A despeito de ser considerada uma contratação lícita, a terceirização da atividade médica não conta com a aprovação total do Conselho Federal de Medicina, que considera esse tipo de contratação vantajosa para o empregador e prejudicial ao prestador de serviços, vez que além de perceberem em média 38% a menos que empregados de outros setores produtivos, ficam à margem da percepção dos demais benefícios trabalhistas e previdenciários, conforme destacado no 2º Encontro Nacional dos Conselhos de Medicina realizado em dezembro de 2018, em Brasília/DF.

Comungando deste mesmo posicionamento contrário à contratação médica sob o regime de pessoa jurídica, outras entidades médicas nacionais (Associação Médica Brasileira, Federação Médica Brasileira, Federação Nacional dos Médicos e Associação Nacional dos Médicos Residentes) formularam um manifesto aprovado no XIII Encontro Nacional das Entidades Médicas, em junho de 2018, visando combater a precarização dos vínculos trabalhistas e assegurar as prerrogativas médicas.

Mesmo não estando plenamente de acordo com esta modalidade de contratação de médicos através de CNPJ, o CFM não impõe qualquer tipo de óbice, nem deixa de prestar o devido suporte à categoria, em casos de fiscalização e autuação pela Receita Federal, para auxiliar os profissionais que estabelecem essas contratações de forma legítima.

Conclusão

Dessa forma, entendemos que cabe ao profissional da saúde fazer uma avaliação acurada acerca do tipo de contratação a qual vai se submeter, levando em consideração todos os benefícios trabalhistas e previdenciários que serão percebidos e garantidos no caso da vinculação trabalhista formal, ou, certificar-se de todos os encargos fiscais e demais regramentos tributários a que estará sujeito, caso opte por abrir sua inscrição de CNPJ para prestação de serviços nesta condição, sendo de suma importância, portanto, que busque suporte prévio com consultoria contábil e jurídica idôneas.

Fonte: Marcelo Ribeiro (advogado)

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